segunda-feira, 15 de junho de 2009

Feriados, desenvolvimento e Brigitte Bardot



Ocorreu na última quarta-feira. Enquanto eu aguardava o chaveiro concluir a cópia de uma chave tetra, foi que ouvi novamente a velha ladainha contra os feriados. Um sujeito ao lado, que aguardava a vez, ao ser informado pelo chaveiro que não poderia voltar no dia seguinte já que era feriado, esbravejou: mas nesse país só tem feriado!!!

E não é só ele. Muita gente tem essa ideia de que a quantidade de feriados no Brasil é excessiva e de que isso atrapalha o desenvolvimento do país, afinal, quando é feriado ninguém trabalha!

Mas será mesmo verdade?

O ideal é consultarmos a matemática dos números, pois ela não mente jamais. Vejamos, tomando o Rio de Janeiro como referência - já que cada cidade acaba tendo o seu feriado local - no ano de 2009 teremos 16 feriados, isso porque eu resolvi dar logo três dias para o carnaval (oficialmente são apenas dois).

Fazendo as contas, vemos que os feriados representam algo em torno de 5% do correr do ano. Parece muito pouco para acusá-los de atrapalhar o desenvolvimento de um país.
O tema é polêmico e abre um flanco para falar de uma indústria poderosíssima e que parece pouco compreendida em nosso Brasil por uma parte da população e, principalmente, pelos governos, visto a ausência de políticas públicas que incentivem o turismo no país e ao país.

É um ingênuo engano associar feriados com vagabundagem, pernas pro ar ou como um dia simplesmente improdutivo. Quem pensa dessa forma deve achar que as pessoas ficam em suas residências assistindo televisão enquanto esperam o feriado terminar. Há muito trabalho nos feriados, basta visão e compreensão do seu potencial para transformá-los em verdadeiras máquinas de gerar emprego, renda e desenvolvimento.

São os feriados que levam oxigenação econômica para as pequenas localidades, com o deslocamento de milhares de pessoas das capitais para os interiores e praias deste país continental. São os feriados que geram empregos em cidades como Morro de São Paulo, na Bahia, Porto de Galinhas, em Pernambuco, Caldas Novas, Goiás, Gramado e Canela, no Rio Grande do Sul, Brotas, em São Paulo, ou Búzios, no Rio de Janeiro. Apenas para citar algumas poucas dentre as mais famosas.

O turismo gera tantos empregos diretos e indiretos que seria difícil citá-los todos aqui. Eu ousaria dizer até que a indústria do turismo é capaz de fazer girar todos os setores da economia. Podemos começar pelo óbvio, falando de garçons, cozinheiros, camareiras, mas o turismo também movimenta a construção civil, seja com a construção ou reforma de pousadas e hotéis, seja pela construção de casas particulares. Daí estamos falando de mestres de obra, pedreiros, carpinteiros, e nisso entram o donos de lojas de material de construção, que empregam vendedores, estoquistas, etc. E podemos voltar para o comércio com as farmácias vendendo protetor solar ou repelentes, padarias que servem o café da manhã a você ou ao dono da pousada, podemos falar da locação de veículos, de empresas de transporte (temos que ir e vir, não é mesmo?), motoristas, frentistas (temos que abastecer, não é mesmo?). Enfim, preciso mesmo continuar com essa lista?

Mas o fato é que continuamos a ignorar o potencial turístico de nosso país. Persistimos em não entender que essa é a nossa verdadeira vocação. Sim, viva a Petrobras, grande conquista! Viva a Embraer! Mas precisamos aproveitar as oportunidades que temos em nossas mãos.

Falamos que os números não mentem jamais? Então voltemos a eles. Os dados são da Organização Mundial de Turismo (www.unwto.org). A entidade publica um documento anual que chama de Barômetro Mundial do Turismo. Nele são analisados dados dos 50 países com melhor rendimento neste segmento. O Brasil está na posição 41 com algo em torno de 5 milhões de visitantes internacionais por ano. O número pode parecer impressionante se em primeiro lugar não estivesse a França, com 80 milhões de visitantes no mesmo período.

Outro dado significativo é o seguinte, apenas a Torre Eiffel tem mais visitantes do que todo o Brasil. Dados da página oficial do monumento parisiense informam que por ano são cerca de seis milhões de bilhetes vendidos.

Para não acharmos que isso é coisa de Europa ou Estados Unidos, o mesmo documento da UNWTO mostra que os hermanos mexicanos recebem 21 milhões de turistas/ano. Algo não estamos fazendo.

Agora já não achamos mais os 5 milhões de turistas estrangeiros que visitaram o Brasil grande coisa, não é mesmo? Mas mesmo assim essa presença foi capaz de gerar cinco bilhões de dólares em receitas para o nosso país. Imagine se um dia chegarmos ao posto da Austrália, que com 20 milhões de visitantes/ano arrecada 22 bilhões de dólares. Ou mesmo a Itália, com um território 30 vezes menor que o brasileiro, consegue figurar na lista em quarto lugar faturando U$ 42 bilhões por ano.

Mas parece mesmo que são os estrangeiros que entendem do assunto. Termino o artigo com a curiosa história de Búzios, uma pequena península próxima de Cabo Frio, no estado do Rio. Sua fama e fortuna estão associados a dois forasteiros. Primeiro veio a atriz Brigitte Bardot, em 1964, elevando a pequena localidade ao status de uma Saint Tropez. A cidade a retribuiu nomeando sua rua principal com seu nome: “Orla Bardot”, com direito à estátua de bronze e plaquinha comemorativa.

Depois, nos idos anos oitenta, chegou o belga Philippe Michel. Tife, como é conhecido, depois de rodar o mundo apostou em Búzios para investir em turismo. Nascia em 1983 a primeira creperia no Brasil, a Chez Michou, hoje um sucesso com franquias espalhadas em vários estados. Ainda falando com forte sotaque francês, Tife não entende a polêmica. “Acho os feriados necessários, principalmente para as pessoas da cidade grande saírem do sufoco em que vivem, saírem do stress, da poluição”, defende. O empresário conta que quando chegou na cidade eram apenas 8 mil habitantes e que hoje a cidade é lar de 36 mil pessoas, dessas, ainda segundo o belga, 90% dependem do turismo. “Quando cheguei acharam que eu estava doido em oferecer uma comida que ninguém conhecia, a comida local era o peixe frito e o Prato Feito. Perguntavam: que isso, você não serve com arroz, feijão e farofa?”, se diverte.

O turismo, erroneamente associado aos mais abastados, à gente rica, a quem tem vida boa - e talvez daí possa emanar o preconceito contra os feriados - é justamente uma ferramenta de promoção social, de distribuição de renda, de manutenção do morador em sua cidade natal, evitando o inchamento das capitais e, em um nível mais subjetivo, uma atividade essencial para não nos matarmos todos nesta louca vida das metrópoles. Mas vai muito além, viajar é o que nos faz humanos, o que nos conecta com nossa origem nômade, que no ensina e renova nosso olhar. O que se aprende viajando não está nos livros nem nas faculdades.

* o colunista viajou a Búzios e pagou por todas as suas despesas.


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