sábado, 18 de agosto de 2012

As Olimpíadas, a guerra dos canais e a volta do limoeiro!

Bolt!

Ao longo de todo o primeiro semestre, a Rede Globo deu a entender que simplesmente ignoraria os jogos de Londres. O impacto poderia ser quase nenhum se não fosse a emissora a detentora de mais de 70% da audiência nacional e, acima de tudo, sendo o veículo de comunicação que influencia a cobertura do jornalismo que se faz no Brasil.

A transmissão foi perdida para a TV do bispo Edir Macedo, que em uma ousada(ilegal?)  jogada, a arrematou por 60 milhões de dólares. A Globo havia oferecido metade.

Segundo o diretor-geral da Rede Globo, Octavio Florisbal, o valor deveria ser esse mesmo, cerca de U$30 milhões. “Nós tínhamos uma visão de que os Jogos Olímpicos de 2012 deviam valer entre US$ 25 milhões e US$ 30 milhões. Porque a anterior se tinha pago US$ 15 milhões. E foi essa oferta que fizemos, dentro da realidade de mercado. Nós vivemos de audiência e publicidade. Se passar daqui, vai dar prejuízo. Até onde eu quero ir com este prejuízo?", declarou em entrevista ao colega Maurício Stycer, do UOL. 

A ausência da Globo nas transmissões gerou uma consequência clara e preocupante. Sem ela, o evento pareceu, por algum tempo, que sequer existia.

E essa consequência, que é muito mais preocupante do que saber a origem do dinheiro pago pela Record, é constatar que uma nação de 200 milhões de habitantes forma sua opinião a partir de um único veículo de comunicação.

O mesmo já havia acontecido em 2011, quando ignoramos por completo a realização dos Jogos Panamericanos, sediados na cidade mexicana de Guadalajara. A transmissão do Pan 2011 também tinha sido arrematada pela Record.

Mas será?
Desde que a data dos jogos se tornou visível no horizonte, o colunista ficou na expectativa de como seria a cobertura da Globo em relação as Olimpíadas. Ter ignorado o Pan 2011 era uma coisa, agora em uma Olimpíada, o buraco seria mais embaixo.

Mas não houve um segundo sequer no Jornal Nacional, Jornal da Globo, Jornal Hoje... Nada, absolutamente nada. O jornalismo da emissora chegou a cobrir ostensivamente as Olimpíadas Escolares, sem dar uma nota sobre a preparação de nossos atletas olímpicos, que nada tinham a ver com a briga entre a Globo e a Record.

Arthur Zanetti nas argolas.
Talvez com uma cobertura digna, tivéssemos sabido que um certo paulista de São Caetano do Sul, de nome Arthur Zanetti, vinha se preparando forte nas argolas...

O silêncio da Globo em relação aos jogos chegou muito próximo de um boicote. Mas alguma mente sensata na diretoria da Globo deve ter peitado: “temos que cobrir os jogos!!!”.

Mas isso só ocorreu quando já era tarde demais.

A emissora ainda teve a empáfia de se apresentar como vítima, se dizendo excluída e citando as regras do COI para justificar sua pobre cobertura. Ainda popularizou um novo adjetivo: não-detentora.

Um comunicado foi publicado em sua página institucional:

 “A cobertura jornalística da Rede Globo dos Jogos Olímpicos 2012 seguirá dois princípios de que não pode abrir mão: informar os seus telespectadores e respeitar acordos sobre direitos esportivos.

Para isso, a emissora comprou da Olympic Broadcast Services o acesso às imagens dos Jogos Olímpicos vendido a não detentores dos direitos de transmissão que aceitam as regras do COI (Comitê Olímpico Internacional) para a utilização jornalística em suas coberturas do evento.

(...)*

Seguindo a experiência internacional, e sem ferir as regras do COI, fotos serão utilizadas sempre que imagens de um evento não puderem ser exibidas.

São restrições importantes do COI que a TV Globo acata num esforço para bem informar os seus telespectadores. Como acontece em todo o mundo com os não detentores de direitos de transmissão, o respeito a essas regras implicará, naturalmente, uma cobertura mais limitada do que a que realizamos nos últimos anos, mas suficiente para divulgar as principais notícias sobre os Jogos Olímpicos”.


Vejamos como se posicionam. Dizem que não podem abrir mão de informar seus telespectadores. Se expõe sujeitos a fortes restrições e se colocam como limitados para apresentar uma melhor cobertura.

Mas fica a pergunta. Se pretendiam cobrir as Olimpíadas, mesmo amarrados pelas regras do COI, porque não cobriram, ao longo do primeiro semestre, a preparação de nossos atletas? Quem eram? De que cidades vinham? Que modalidades competiríamos? Não creio que essa restrição estivesse prevista nas regras do COI...

Será que Teresina era tão longe assim para contar a história da judoca Sarah Menezes, primeiro ouro do Brasil em Londres, primeiro ouro da história no judô feminino?

Cínica, a emissora carioca se fez de morta.

Como pôde ignorar um evento dessa magnitude? Duzentas e quatro bandeiras nacionais estavam representadas nos jogos, isso mesmo, 204 nações. Que traz aliás uma curiosidade, a ONU só reconhece 193 nações soberanas. Então o COI é ainda mais generoso, mais plural, mais diverso do que as Nações Unidas.

Ao todo foram 10.820 atletas reunidos em 302 eventos esportivos cobrindo 26 modalidades. A maior delegação, naturalmente, foi a da Inglaterra, que por ser a dona da casa tem o direito de inscrever atletas e equipes em todas as categorias sem a necessidade de participar das classificatórias (o Brasil terá o mesmo direito em 2016). Os britânicos chegaram com 541 atletas, os EUA com 530, e o Brasil com 258. Mas também estavam lá o Timor Leste, a Guiné Equatorial e a República de Nauru, uma ilhota no Pacífico Sul, com dois atletas cada.

Medalhas, fama e dinheiro
Outra curiosidade desta Olímpiada, que a restrita cobertura também não mostrou, foi a grande polêmica em torno dos atletas mercenários, como foram chamados por parte da imprensa britânica.

Em pauta estava o que eles batizaram de Plastic Brits, ou em tradução direta, os Britânicos de Plástico. Uma referência aos atletas profissionais de outras nações que se naturalizaram ingleses em troca de benefícios financeiros.

De fato houve um investimento bilionário na formação dos atletas locais, ao todo 300 milhões de libras, cerca de 1 bilhão de reais . E o resultado foi colhido no quadro de medalhas. Das 19 medalhas de ouro ganhas em Pequin, os ingleses arremataram desta vez 29. Fica a dica.

Mas também é fato que cerca de um terço das 65 medalhas conquistadas, incluindo prata e bronze, foram ganhas por atletas imigrados, sendo a grande estrela desta constelação o somali Mohamed “Mo” Farah, ouro nos 10 e 5 mil metros. Junto a ele enfileiram-se o belga Bradley Wiggins, ouro no ciclismo; a alemã Laura Bechtolsheimer, ouro no hipismo, entre outros que ajudaram a dourar o quadro de medalhas inglês. Até um brasileiro estava neste time de súditos da rainha. O carioca Mark Plotyczer, que apesar do nome, é filho legítimo de Copacabana. Mark defendeu as cores ingleses no vôlei de quadra.

Durante o farto debate na imprensa britânica, o COI se declarou impotente para interferir em assuntos de soberania, mas deixou clara a sua insatisfação com a migração de atletas tendo como pano de fundo a motivação financeira (obs: Mo Farah não se enquadra neste cenário. O somali é considerado um refugiado).

Aliás não só a Somália vem oferecendo ao mundo exímios corredores, como vários outros países africanos. Algo que talvez os estudos da genética deva se debruçar um pouco.

Os africanos há décadas dominam todas as provas de média e longa distância. Em Londres, além de Mo Farah, o queniano Wilson Kipsang venceu a maratona, tendo em sua cola o compatriota Martin Lel e o etíope Tsegaye Kebede. No final, uma olimpíada é um misto de competições que misturam força muscular, técnica, pontaria e resistência. Ou seja, tem lugar pra todo mundo, dos magrinhos corredores aos super-pesados do judô. O que é bom.

O cabelinho escovinha não esconde as origens de Wang (de costas)
Mas este novo cenário não é exclusivo dos ingleses. Estas repatriações, seja de que origem e com qual interesse, já mostra um mundo diferente. Vejamos o brasileiro Hugo Hoyama, super-campeão do tênis de mesa, brasileiríssimo de São Bernardo do Campo, mas cujo sobrenome não esconde as origens. Hoyama perdeu para o Polonês Wang Zengyl. Um polonês falsificado. Chinês que era...

O mundo está mudando, e não é a economia.

Simona neles!
E no mais foi isso. A Jamaica, que competiu apenas com jamaicanos, deixou de ser a terra de Bob (Marley) e passou a ser a terra de Bolt (Usain). Aliás, o atleta da Jamaica fez um curioso gesto ao final da sua vitória nos 100 metros rasos. Com o dedo indicador nos lábios, mandou o mundo ficar calado.

Com quem falava Bolt? Com aqueles que previram o seu fracasso em Londres? Riu por último, afinal são jogos Olímpicos, e não de adivinhação...

E o Brasil não fez feio. Mas também não fez bonito. Como uma nação que sediará os próximos jogos, nosso país já deveria estar investindo muito na formação de novos atletas, ou no aperfeiçoamento dos que têm idade para chegar em forma competitiva em 2016. O que vimos até agora foi um aquecido mercado da construção civil.

Ao longo de toda a trajetória olímpica, o Brasil já ganhou 108 medalhas, sendo 23 de ouro, 30 de prata e 55 de bronze. Nosso irmão do norte, os EUA, nos deixa em uma situação muito constrangedora. São 2406 medalhas, sendo 976 só de ouro.

Há muito trabalho pela frente.

Mas nem tudo são dores (musculares ou não). Há que se tirar o chapéu para a equipe responsável pela participação brasileira na Cerimônia de Encerramento. Que coisa linda aquilo. E que medo estava o colunista, minutos antes de nossa emtrada em cena, que aparecessem mulatas, araras e índios pintados de urucum.

O show foi perfeito e de um bom gosto irretocável, e ousadia pouco vista. Alguém esperava o excelente - porém desconhecidíssimo do grande público - B Negão? Um dos fundadores do Planet Hemp (que lançaria também o cantor Marcelo D2), B Negão cantou Maracatu Atômico na versão de Chico Science & Nação Zumbi. Ousadia sobre ousadia!

Isso sem falar no início triunfal do gari Sorriso. Quem um dia apostaria que um funcionário da empresa de limpeza urbana do Rio de Janeiro representaria a nossa nação aos olhos do mundo? Quem?! E que descontração! Sorriso estava em casa!

Mas a surpresa máxima estaria reservada para o final. Seu Jorge, esse sim super conhecido internacionalmente, o filho do município fluminense de Belford Roxo, entrou cantando, no mais elegante conjuntinho de Malandro, nada mais, nada menos que ele, Wilson Simonal!!! Quem apostaria nesta volta triunfal do extraordinário Simona? Que do céu devia estar falando: agora só esse lado cantando... Só as mulheres... Agora todo mundo: meu limão, meu limoeiro...



KF


em tempo:

·        pelo apurado até agora, a transmissão das olimpíadas foi um péssimo negócio para a Record. A emissora ficou em terceiro lugar e bem abaixo dos índices de audiência de Pequin 2008. Pelas ruas onde andou o colunista, todos os televisores estavam sintonizados no... SporTv!
·        As Paraolimpíadas, que agora estão sendo chamadas de Paralimpíadas, começam no dia 29 de agosto. É imperdível, isso sim pode ser chamado de superação. O colunista não sabe dizer quem vai transmitir...
·        Fechando: a cobertura da Record pode ser simbolizada pela gafe da experiente jornalista Ana Paula Padrão. Mesmo estando já há 3 anos na Record, foi capaz de chamar, ao vivo, o Jornal da Record de Jornal da Globo (clique e  confira...).
·         Como diria o Simonal: Nem vem de garfo que hoje é dia de sopa!