segunda-feira, 18 de julho de 2011

Rio de Dinheiro: 2014-2016


Arion, o mascote dos Jogos Militares 2011

A nobre leitora e o prezado leitor já devem ter ouvido por aí que estamos iniciando a Década de Ouro brasileira.  Mas o que, na opinião do colunista, vale realmente conferir é para quem irá o ouro. E não estamos falando de medalhas.

Os grupos

Eventos esportivos de grande porte custam mesmo fortunas. E onde fortunas estão sendo gastas, há os grupos empresariais interessados nos lucros.

Dois grupos estão envolvidos com a vinda da Copa do Mundo e das Olimpíadas para o Brasil. De um lado as empresas que fazem negócios com o cartola Ricardo Teixeira, que há 22 anos comanda a CBF. De outro o grupo que fecha contratos com o chefão do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Arthur Nuzman, a frente da instituição há 16 anos.

Chama a atenção o fato de que, desde que vencemos as duas concorrências, o único assunto que ocupa as páginas dos jornais quando o tema é tratado não são os esportes, a preparação dos atletas, o investimento em centros de treinamento, mas sim os valores dos orçamentos, o estouro dos orçamentos, o sigilo nos valores do orçamento, os atrasos na execução que geram orçamentos cada vez mais altos em um rio de dinheiro que não sabíamos nem que tínhamos em nossos cofres.

Mas e do esporte? E o investimento nas novas gerações? Saberíamos dizer quem são as promessas? Quem são os atletas que o Brasil está formando para se destacar em casa, assim como fizeram os chineses?

O Projeto 119

Assim que soube que sediaria as olimpíadas de 2008, o governo chinês lançou um ambicioso projeto em busca do topo do ranking das medalhas. O objetivo era claro: superar os Estados Unidos!

A China então investiu cerca de 6 bilhões de dólares na formação de atletas em 3000 escolas esportivas espalhadas pelo país. Trouxeram de diversos países especialistas nas modalidades que eles ainda não dominavam. O projeto se chamou 119 pois os chineses se deram conta de que era justamente nas modalidades onde vinham tendo resultados menos expressivos, no caso o atletismo, natação, remo, vela e canoagem, que estavam uma grande quantidade de medalhas de ouro em disputa, no caso, precisamente 119 delas.

O resultado a gente viu no final. A China superou os EUA com ampla vantagem: 51 ouros contra 36 dos norte-americanos (o Brasil conquistou 3 ouros). A isso podemos chamar de projeto olímpico, por mais desagradável que seja para o colunista elogiar o regime chinês.


Apagão da informação

Se parece que os órgãos ligados ao esporte não estão preocupados com a formação dos nossos atletas, tão pouco a imprensa está interessada no assunto.

E os motivos talvez sejam os mesmos que movem os grupos empresariais que tanto lutaram para trazer estes jogos para o Brasil: lucro. E no caso da imprensa, o motivo pelo hiato na cobertura pode estar justamente na ausência desse retorno financeiro.

Para que o leitor que não conhece ou acompanha de perto a maneira de se fazer jornalismo no Brasil, vale uma breve iniciação.

Lamentavelmente, vivemos um mercado dominado por apenas uma empresa, a Rede Globo. Para se ter uma dimensão mais palpável do que estamos falando, a Globo (ainda) detém 70% do mercado publicitário. Não há aqui uma crítica a emissora neste quesito, visto que a qualidade do que produz merece a fatia de mercado, mas deixar a formação da opinião nas mãos de apenas um grupo jornalístico, tem o seu preço.

A Globo é tão influente que forma a opinião não só de seus clientes, mas também da concorrência tamanha é a força da sua marca e da sua máquina. Para entender como isso funciona na prática, basta dizer que todas as redações do país param para assistir os telejornais da emissora, seja o Jornal Hoje, Jornal Nacional ou Jornal da Globo. O que sai ali é o que vai ser notícia. O que sai ali é o que se vai atrás.

Mais jogos ainda

No momento em que publicamos mais esse texto, inicia-se no Rio de Janeiro os Jogos Mundiais Militares, um evento esportivo não tão vigoroso como as Olimpíadas, mas com certeza maior que os Jogos Pan-americanos.

Mesmo assim, não fosse a publicidade paga, provavelmente nem nos daríamos conta de que um evento que reúne 6 mil atletas vindos de mais de 100 países, em 20 modalidades, algumas presentes apenas em jogos desta categoria, está acontecendo no país.

Para ilustrar o argumento, podemos dizer que os números acima não foram capazes de seduzir, por exemplo, os editores do dominical Esporte Espetacular da TV Globo que, apesar de sua épica duração de 3 horas, não deu nenhuma linha sobre os Jogos Militares na edição que precedeu o início da competição.

Não se mostrou quem são os atletas-militares que irão defender o Brasil ao longo dos nove dias de competição, não se documentou como foi sua preparação. Não foram apresentadas as sedes dos jogos. Não foram divulgadas as modalidades, algumas exclusivas dos Jogos Militares como o natação de salvamento, natação utilitária, paraquedismo, corrida de orientação, ou o até mesmo a pouco simpática (e deveras arcaica) lançamento de granadas (isso mesmo, nobre leitor, lançamento de granadas!).

Nada disso foi capaz de atrair a atenção da Rede Globo, e por consequência...

Daí começa a parecer que o jornalismo praticado pela Globo não está interessado no esporte, mas sim nos contratos publicitários que um evento como este gera para a empresa. Ou seja, não havendo lucro, não há cobertura.

Ok, vamos lá.  Aqui temos apenas um colunista e não um comunista. Nada contra o lucro. Mas cabe a um veículo de comunicação, até pelo seu caráter de concessão, uma certa dose de participação voluntária no desenvolvimento de seu país.

Mas caso o leitor ainda esteja achando o colunista exagerado, quase revanchista, aqui vai mais um argumento, e esse assaz escandaloso.

Pan pan pan pan!

O leitor saberia dizer quando serão os próximos Jogos Pan-americanos? Saberia dizer onde será realizado?

O leitor ficaria surpreso se o colunista lhe informasse que os Jogos Pan-americanos acontecerão dentro de 3 meses na cidade mexicana de Guadalajara?

Sim, dentro de três meses teremos novamente os jogos que unem os atletas das Américas!!!

Saberíamos dizer que são os atletas que se prepararam nos últimos quatro anos para representar a nossa bandeira no México? O nosso velho e bom México de boas lembranças da década de 1970?

Pois é nobre leitor. E você quer saber por que isso está acontecendo? Você quer entender como sua opinião é formada e manipulada?

A compra do pódio

Há dois anos atrás aconteceu algo inédito no mercado jornalístico brasileiro. Pela primeira vez a Rede Globo teve sua hegemonia abalada, perdendo um edital internacional para a aquisição de direitos de transmissão. Quem venceria seria a TV Record, que através de uma oferta milionária adquiriu os direitos de transmissão de Guadalajara 2011.

Entendeu agora por que parece que o Pan não está acontecendo?

Fica claro também que o compromisso da Globo não é com o atletismo nacional, com o esporte, com tudo o que vem nesse pacote (saúde, bem-estar, patriotismo e quetais) mas sim com contratos publicitários. Sendo assim, o fato comercial supera o fato jornalístico.  

Mas isso ainda não é o mais grave. A TV Record também venceu a Globo para as Olimpíadas de 2012 em Londres!!!!  É ou não é algo nunca antes visto na história deste país?

E agora? Será que a Globo vai ignorar também as Olimpíadas de 2012?

Fosse o compromisso com o esporte, deveríamos estar assistindo através das lentes da líder de mercado, que sem dúvida alguma tem as melhores equipes de jornalistas e cinegrafistas, não só do Brasil como do mundo, uma cobertura exemplar para os Jogos Panamericanos, que a partir de 2007 passaram a fazer parte do nosso vocabulário.

E porque não exigir o mesmo para os Jogos Militares? Não só pelo seu ineditismo (está apenas em sua quinta edição), mas pela inspiração que pode trazer a uma nação.

Se fosse profissional, teríamos acompanhado a bela cerimônia de abertura onde, em um gesto ousado e moderno para uma instituição conservadora e masculina como as Forças Armadas, foi concedida a uma mulher a honra de hastear a bandeira nacional diante da Pira Olímpica. Mas não só uma mulher, mas a primeira oficial de origem nativa, a tenente Sílvia Wajãpi.

No final acabamos descobrindo que a imparcialidade é um mito e que o ouro, talvez seja de tolo.




KF


Em tempo:

  • Os Jogos Militares seguem até dia 24 de julho. Todas as competições com entrada franca.
  • Também nos Jogos Militares o orçamento estourou. Quem paga a conta é o Ministério da Defesa. Ou seja, eu e você.
  • A TV Record é de propriedade do Bispo Edir Macedo, dono também da Igreja Universal do Reino de Deus.
  • É difícil de acreditar que as verbas publicitárias da Record tenham sido suficientes para bancar o compra dos direitos de transmissão do Pan 2011 e Olimpíadas 2012.
  • Os militares chineses já lideram o ranking de medalhas dos Jogos Militares.
  • Dilma não foi vaiada.
  • Para mudar de canal use o controle-remoto.